Covid-19
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03
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2020

O protagonismo da alimentação nos momentos de crise: a situação de Portugal

Adriano Andreghetto
Consultor em Marketing Digital - PhD Student - Universidade Helênica (Grécia)
O texto discute a importância do comportamento consciente durante a pandemia em Portugal, destacando ações solidárias na alimentação e compras em supermercados.

Confinamento, Quarentena, Isolamento. Nas últimas semanas estas palavras passaram a fazer parte do vocabulário de toda a população. Em Portugal, como em outros países, procura-se por alternativas dentro de rotinas já tão padronizadas e se dá maior valor às necessidades mais básicas como, por exemplo, a alimentação.

Nestes momentos de crise, a hierarquia de necessidades de Maslow consegue ser facilmente percebida nas atitudes e preocupações das pessoas. Já não há preocupação com o próximo lançamento do iPhone ou na compra de uma nova TV de última geração; procuramos satisfazer nossas necessidades primárias e mais básicas como segurança, saúde, água e, obviamente, a alimentação.

Protagonismo alimentar e açambarcamento.

O alimento e a alimentação assumem um protagonismo tão grande que podem levar a compras irresponsáveis, individualistas e, como dizem aqui em Portugal, ao açambarcamento (reter tudo ou quase tudo para si*). Aqui vale um reforço, caso o sentimento coletivo não se sobreponha ao individualismo: em Portugal, "o cidadão comum pode, ao praticar o crime sob a epígrafe “Açambarcamento do adquirente”, ser punido com pena de prisão até seis meses".

A ida ao supermercado tem um novo formato

Sair para fazer compras em momentos de quarentena e estado emergência tem um novo formato: os mercados têm capacidade máxima reduzida, havendo controle de entrada. Existem filas, mas estamos longe do caos que às vezes é noticiado nas redes sociais. As medidas são preventivas e necessárias, e devem ser adotadas pela população como forma de evitar medidas mais extremas. Para além da capacidade máxima dos estabelecimentos, recomenda-se uma distância de segurança nas áreas externas e internas (com marcações no chão), pede-se o pagamento em cartão/multibanco e alguns itens, como álcool, têm venda controlada.

Para além das grandes redes de supermercados, devemos estar atentos às pequenas mercearias e frutarias ao redor de nossas residências. Incentivem o mercado local, consumam destes pequenos comerciantes que têm muito menos fluxo de caixa para sobreviverem a uma crise, quando comparados com as grandes redes. São mercados menores, que têm menor frequência de pessoas e nos quais se consegue um controle muito maior quanto a higienização. Conversem com os proprietários, façam compras pelo telefone e só se dirijam ao local para retirar os produtos, por exemplo. Seja solidário com estes pequenos empresários que, hoje mais do que nunca, precisam de nossa ajuda!

Não haverá quebra na Cadeia de Abastecimento

Um relatório elaborado pela Kantar indica que durante o mês de fevereiro, com o aumento dos casos confirmados em Portugal e no mundo, os gastos dos portugueses nos supermercados aumentaram 13% em compra – o equivalente a mais 39,40 euros por cada ida ao supermercado. No entanto, o português tem ido menos vezes ao supermercado, visto que sair de casa hoje tornou-se uma questão de segurança.

Apesar de diversos relatos de falta de itens nos supermercados (e eu me recuso a falar sobre a corrida ao papel higiénico), o governo português tem feito seu papel e, por diversas vezes, tem acalmado a população quanto ao medo da iminência de uma crise alimentar. A resposta é sempre a mesma: não haverá falta de alimentos nos supermercados. Pela minha experiência, e dos que estão próximos a mim, não vi nenhuma prateleira vazia, não senti falta de nenhum item e consegui fazer compras normalmente.

A Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) “garantiu que não haverá problemas de produção e abastecimento de produtos alimentares, sobretudo de frescos como frutas, legumes, leite, carne e ovos, devido à pandemia provocada pelo novo coronavírus.”

As principais redes de supermercados do país (Aldi, Apolónia, Continente, Intermarché, Minipreço, Lidl, El Corte Inglés, Auchan, Mercadona e Pingo Doce), em conjunto com a APED (Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição), emitiram ontem (17 de Março) um comunicado que recebeu o título de “Continuar a alimentar Portugal”. O documento apela à consciência dos cidadãos portugueses para que sejam solidários e responsáveis, agradece aos seus colaboradores e informa que “não há neste momento sinais de rutura no fornecimento de produtos às nossas lojas”.

O Ministério da Agricultura, na mesma data, também assegurou que o abastecimento alimentar está a decorrer com normalidade, apesar do impacto da Covid-19. No entanto, reforçam o pedido das cadeias de supermercados e apelam “à consciência cívica” para que seja feito um “consumo responsável” e adequado às necessidades de cada cidadão.

Conclusão

É visível o entendimento das autoridades quanto à manutenção de certa normalidade quando se fala em alimentação. Obviamente, há grande interesse económico por parte das grandes redes de supermercados, no entanto, parece-me haver bastante consciência do importante papel que todos estes players desempenham neste momento.

O ponto crucial aqui é o comportamento da sociedade. Percebe-se nas entrelinhas de todas as notícias e comunicados oficias que não haverá problema algum de abastecimento, mas SE, e somente SE, não houver compras desnecessárias e uma guerra individualista no consumo. Portanto, é hora de exercitarmos o coletivismo mesmo quando vamos ao supermercado.

Sobre o autor:
Adriano Andreghetto é formado em Ciências dos Alimentos pela ESALQ/USP e Mestre em Marketing Digital pela Universidade Europeia (Lisboa) cujo tema da dissertação é “A procura por informação sobre alimentação saudável nos media digitais”.  Vive em Portugal desde 2017 e é atualmente responsável pelas ações de Marketing Digital da Verakis. Durante sua carreira já trabalhou com projetos nas áreas de sustentabilidade e desperdício de alimentos, com projetos em Portugal, Suíça e Alemanha.

Fontes:

Imagem:  Photo by David Clarke on Unsplash

*“açambarcamento”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2020, https://dicionario.priberam.org/a%C3%A7ambarcamento [consultado em 18-03-2020].

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