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2020

Hora de fugir do coronavírus e do caos – Protagonismo do alimento nos momentos de crise

O Brasil enfrenta desafios no equilíbrio entre controle da Covid-19 e manutenção da economia, com difícil decisão sobre a duração da quarentena.

O Brasil passa atualmente por um processo bastante complicado por causa da expansão da pandemia do coronavírus, que chegou ao país principalmente pela maior cidade que é São Paulo e foi aos poucos chegando aos outros estados, porém em cada um com grau de intensidade diferente.

A grande polêmica que se instalou na sociedade é que condutas adotar para preservar as vidas e ao mesmo tempo manter a economia funcionando em uma proporção capaz de não causar o caos, principalmente nas populações de baixa renda que são as que de imediato, perdem seus empregos, seus pequenos negócios, suas atividades que os tornam capazes de pelo menos manter as famílias sem passar fome e pagar suas despesas básicas.

Sem dúvida uma situação complexa que exige muita informação, experiência e uma certa frieza para que a autoridade possa decidir com o máximo de racionalidade, com pulso firme e sem vacilar, pois qualquer que seja a decisão sempre irá contrariar parte significativa da população.

Impossível paralisar certos setores produtivos a começar pelos alimentos, combustíveis, farmacêutico, bem como transportes, equipamentos para distribuição de alimentos (supermercados, mercados municipais, feiras livres), farmácias, sistema bancário, alimentos preparados via delivery, internet, dentre outros.

A verdade é que de um modo geral, um país que nunca passou por guerras, ou desastres naturais em grandes proporções, como vulcões, tsunamis, tufões, sente muito mais as restrições em comparação com outros países que já passaram por experiências que os obrigaram, independentemente de atuação do governo, a se reorganizar para continuar vivendo.

Felizmente não é o caso, a população encontra alimentos, transporte, medicamentos, combustível, de forma que muitos continuam trabalhando mesmo com a quarentena decretada, outros trabalham em regime de home office, dando suporte mesmo a distância para as empresas onde são funcionários, e assim a vida não parou, apenas desacelerou.

O ponto crítico agora é a dosagem da quarentena, motivo de grande discussão, para alguns com catorze dias deveria ser encerrada, com limitações apenas para as pessoas do grupo de risco, outros mais prudentes acham que deveria ser estendida por um período mais longo, trinta dias ou um pouco mais, para garantir um maior achatamento da curva de doentes e que esta possa ser melhor monitorada evitando a sobrecarga do sistema de saúde e ainda outros preconizando no mínimo os três meses, como forma de diminuir o número de doentes e espaçar mais o contágio coletivo, quando o maior número de pessoas irá ter o contato com o vírus desenvolvendo imunidade contra o patógeno.

A verdade é que se torna impossível dissociar a necessidade de manter um equilíbrio entre o combate e controle da doença e as atividades econômicas do país, sob pena da população correr o risco de viver não só um caos na saúde, mas também social, com consequências imprevisíveis, considerando que já havia estatisticamente mais de onze milhões de desempregados em uma economia frágil, em início de recuperação, antes do início da pandemia.

Neste cenário onde as dificuldades se tornam mais aparentes, serve também para crescimento pessoal e também para a busca de alternativas para fugir da crise, como tem ocorrido com restaurantes de diferentes portes, preparando alimentos e vendendo pela internet, uma vez que foi proibida a abertura dos salões para evitar aglomerações de pessoas.

Muitos destes estabelecimentos no futuro, provavelmente irão trabalhar com mais dedicação na venda por meio digital, desenvolvendo novos pratos e embalagens, formas de entrega, situação que em muitos casos não seria praticada se não fosse a pandemia.

O trabalho em home office, poderá ser em breve, uma modalidade muito mais utilizada do que foi até o momento, pois muitas empresas entenderão que foi uma boa experiência, reduzindo custos (empregador e empregado), estimulando maior disciplina e responsabilidade do funcionário, diminuindo o trânsito de pessoas, melhorando o ar da cidade e outras vantagens que surgirão.

Neste contexto o mercado de comida via delivery deverá ser incrementado, porque os que trabalham em casa não terão tempo para preparar alimentos e precisarão do apoio destes restaurantes.

A compra de produtos para abastecimento das residências, desde alimentos, material de limpeza, medicamentos e outros insumos, poderá ser cada vez mais dinâmica, evitando a necessidade da presença do consumidor no estabelecimento, com garantia de ofertas de produtos de qualidade e preços competitivos, com a vantagem da entrega direta, conforme a necessidade do cliente.

É momento de repensar o melhor aproveitamento dos alimentos, diminuindo os desperdícios, a alimentação é o ponto central em qualquer situação, principalmente nos momentos de exceção, como o atual. Supermercados, mercados municipais, feiras livres, poderão fornecer alimentos que não são comercializáveis, para centrais públicas (municipais ou mesmo ONGs), para a melhor utilização possível, impedindo que estes alimentos tenham como destino os lixões.

Mais uma vez, o reforço nos cuidados de higiene se tornarão fundamentais, porque a cada epidemia, as autoridades sanitárias reforçam que lavar as mãos e usar sanitizante é indispensável, mas o tempo passa e não é difícil encontrar manipuladores de alimentos sem lavar as mãos, trabalhando em locais sem nenhuma infraestrutura que possa garantir um mínimo de higiene, banheiros sem papel higiênico, sem água para descarga e para a lavagem das mãos.

O momento será útil para repensar os negócios, ser inovador, criativo, procurar soluções, formas de sobrevivência neste período de grande dificuldade, mas também quem sabe, uma excelente oportunidade para aqueles que se dedicam a produzir, distribuir, preparar alimentos, possam incluir de forma definitiva os cuidados higiênicos necessários para segurança dos alimentos, independente de pandemias ou exigências da fiscalização.

A realidade vivida hoje, deve criar um sentimento que não é só dos menos favorecidos ou empresas ou empregados, mas de todos que pertencem a sociedade, que através do esforço conjunto, consiga encontrar soluções para fugir do coronavirus e ao mesmo tempo evitar o caos no país.

Ricardo Moreira Calil – São Paulo, 02 de abril de 2020.

Ricardo Moreira Calil, é um dos correspondentes Verakis para acompanhar a evolução do setor dos alimentos durante a Pandemia do COVID-19. Ele é Médico Veterinário Sanitarista, professor mestre e doutor pela USP, AFFA do Ministério da Agricultura, docente do curso de Medicina Veterinária da Universidade Municipal de São Caetano do Sul e Coordenador do curso de pós graduação lato sensu em Inspeção e Segurança de Alimentos,da Sociedade Paulista de Medicina Veterinária; também é Presidente da Comissão Técnica de Alimentos do CRMVSP